Foto: Marcelo Vidal/cearasc.com

Muitas são as teorias para o surgimento do Dia Internacional da Mulher. Na mais famosa delas, se conta que em meados de 1911, cem mulheres foram mortas em um incêndio ocorrido em uma fábrica de Nova York, nos Estados Unidos. Por mais que a tragédia tenha, inegavelmente, uma relevante força histórica para a data, outros fatos históricos mostram que a luta do sexo feminino pela igualdade é anterior ao ocorrido naquele trágico dia. 

Falar da luta das mulheres em nossa sociedade é citar uma resistência que parece nunca ser suficiente, mas em mesma proporção se mostra completamente intransponível, pois de forma nenhuma é abalada ou diminuída. 

Causas que se mostram presentes desde os primeiros passos da construção evolutiva das mulheres e que permanecem vivas até o fim da vida de cada uma delas, independente de qual seja a função e/ou profissão que elas venham a escolher. 

O cearasc.com conversou com duas das atletas do Futebol Feminino do Mais Querido e te conta, agora, como Karen, atleta experiente, vitoriosa na carreira e na vida chegou até onde está atualmente. Traçando um paralelo com as conquistas da capitã da equipe, conversamos também com a jovem Ester, jóia da modalidade em Porangabuçu, que carrega em seu olhar o brilho de quem sonha com um mundo de glórias. 

Ainda que componentes de duas gerações diferentes do esporte, os primeiros contatos das duas atletas com a bola foram em meio a pessoas do sexo oposto. 

“Desde pequena sou apaixonada por esporte. Já fiz capoeira, Muay Thay, Jiu-Jitsu e, por último, o futebol. Passei por tudo isso, mas foi no futebol que eu me fixei. Jogo desde os meus 12 anos e é o que eu quero para o resto da minha vida”, disse Ester. 

 “Eu iniciei no futebol com cinco anos de idade, pelo simples fato de gostar muito de correr. Eu não lembro de nenhum momento, quando criança, de mim sem estar vidrada em jogar futebol. Eu gostava de todas as ‘atividades de meninos’. Soltar pipa, brincar de pique-pega, pique-esconde, tudo o que envolvia corrida, eu queria fazer. Sendo assim, não tinha como não me apaixonar pelo futebol. Na minha família não tinha ninguém me incentivando, mas ninguém nunca me proibiu, então tava tudo certo”, afirmou Karen. 

Se para a capitã do Mais Querido atualmente o apoio em casa sempre foi uma realidade, Ester teve de passar por um desafio causado por uma das pessoas mais próximas de si. Em um primeiro momento a prática do futebol precisava ser escondida, devido às dúvidas de seu pai. De todo modo, essas incertezas foram substituídas pelo suporte, quando ele entendeu que aquele era e continuaria sendo o sonho da filha. 

“No início, eu tinha de jogar escondida do meu pai. Jogava com os meninos de perto da minha casa e, quando ele chegava, eu me escondia. Com o tempo, ele foi se adaptando e entendeu que isso era o que eu queria para minha vida e passou a me apoiar, me levando aos treinos e tudo”, pontuou a jovem atleta do Mais Querido. 

Família como base e como sonho 
Sem nenhuma dúvida, a família é uma base para que todos, independentemente do sexo e da profissão, possam estar entregues em seu máximo. A dupla jornada das mulheres em nossa sociedade é mais uma barreira e a necessidade de conciliação da vida profissional com a pessoal torna tudo ainda mais complicado. 

No caso das atletas, as condições impostas pela função desenvolvida fazem com que essa etapa da vida seja atrasada por muito e muito tempo. A busca por uma estabilidade que, por questões financeiras causadas pelo machismo estrutural, vem em passos letárgicos quando comparados ao da masculina faz com que anseios sejam adiados. Consolidada profissionalmente, Karen salienta que precisou focar 100% em sua carreira, em detrimento do sonho da maternidade. 

“Eu tenho o sonho de ser mãe e de construir uma família, mas eu não tive essa condição na minha carreira como um todo. Tive de ‘abrir mão’ desse desejo por boa parte da minha vida por conta da minha carreira. É algo que está  adormecido, mas que eu ainda almejo”, ressaltou. 

Troca de experiências
Os 21 anos de diferença entre Karen e Ester parecem não fazer diferença quando indagamos as atletas quanto às batalhas que elas têm de travar na busca de seus sonhos e objetivos. 

De todo modo, a diferença de idade e experiência em relação aos desafios da vida faz com que a zagueira possa ser uma voz que traduz a sapiência adquirida com o tempo, como explica ao comentar sobre sua relação com as mais jovens do elenco. 

“A gente não pode brincar com os nossos sonhos. Eu tento, ao máximo, mostrar para elas que  nada vem de mão beijada. Hoje, tenho 37 anos e eu tento tirar o máximo de cada uma delas. Faço de tudo para não perder uma bola, quando vejo que elas estão desanimadas, puxo para o treino, dou uma palavra de encorajamento e faço de tudo para que elas sintam e entendam a importância delas para o nosso grupo”, pontuou. 

Uma das interlocutoras da mensagem passada pela capitã, Ester salienta que ela e as outras atletas de maior vivência no futebol se mostram como figuras que devem ser seguidas na busca pelos objetivos por elas alcançados, pontuando, também, o quão significativa foi a luta de cada uma delas para que jovens como ela possam estar vivendo no futebol. 

“A Karen e as outras atletas mais experientes do nosso elenco são espelhos, não só para mim, mas para todas as jogadoras mais jovens. A visão que eu tenho é a de que se não fosse a luta delas e das que vieram antes dela, o futebol feminino não estaria como está hoje”, contou a jovem. 

Por fim, os olhos marejados pela emoção causada pelo assunto não puderam impedir que Karen finalizasse sua fala pontuando os motivos que fazem com que as mulheres passem por dificuldades singulares em relação aos homens. 

“A grande dificuldade que a gente enfrenta é a questão da mulher ter sempre estar provando todo tempo que ela é capaz de fazer qualquer coisa que o homem é capaz. Mesmo quando você prova o nosso valor, tem que continuar batalhando para manter essa imagem, digamos assim. O tempo todo você tem que provar que você é aquilo, que as pessoas devem continuar acreditando em você e isso vai bem além do futebol. A minha tristeza em relação a isso é ter de sempre estar fazendo um esforço que os homens não precisam, finalizou. 

Mesmo que mais de 100 anos depois da definição da data referente ao Dia Internacional da Mulher, a luta segue e deverá seguir para que a desigualdade seja diminuída pouco a pouco. A certeza dessa continuidade se dá, entre outras coisas, pela tal resistência que, mesmo quando parece não ser suficiente, se mostra totalmente indestrutível e fortalece-se ainda mais.

 Matheus Pereira - Departamento de Comunicação - CSC